quinta-feira, agosto 10, 2006

Pipoca

Na rua onde eu morava, tinha um jequitibá e um pé de abóbora, cinco casas caiadas e uma carrocinha de pipoca. Não me pergunte o por quê, eu não saberia responder, mas todos os namorados se encontravam ali – entre o jequitibá e o pé de abóbora. E eram muitos. Mais do que o número absoluto dos habitantes da cidade, mais do que as formigas, mais do que as pipocas.
Um dia, vi um rapaz e uma moça, de pé, parados, olhos nos olhos.
Muito sério, o nariz quase encostado no da moça, o rapaz dizia:
- A reta é o caminho mais curto entre dois pontos.
- Não gosto de retas, prefiro fios -, sorriu a moça puxando uma mexa do próprio cabelo e cobrindo o rosto com ela.
- Não gosto de fios – resmungou o rapaz. – Prefiro riscos.
E escreveu no chão de terra o nome da moça.
- Não gosto de riscos, prefiro linhas - suspirou a moça acariciando a palma da própria mão com a ponta do dedo.
Enquanto os dois discutiam, o jequitibá e o pé de abóbora continuavam sua caminhada silenciosa e lenta. Um, reto, na direção do céu; outro, sinuoso, em busca do mundo.

Rosa Amanda Strausz

6 comentários:

Anônimo disse...

Comadre: Certas palavras, por sua sonoridade encantatória, têm o poder mágico de me evolver. Jequitibá é uma delas. Além do mais, quando duas pessoas estão enamoradas, como aqui, tudo é possível, sobretudo quando se encontram entre jequitibás e jerimuns. Há o suave tecido narrativo e há o olhar da paixão e das imprevisibilidades conteudísticas. Trocando em miúdos, o blogue de vocês já é um dos meus favoritos. Beijos & abraços.

Anônimo disse...

Retas, fios, linhas, riscos. Quem a lê, Rosa, nos seus códigos sensoriais tem a grata surpresa da concisão sem limites. Esse conto tem mais raízes do que folhas secas. É uma terceira árvore. Beijos!

Anônimo disse...

Excelente a qualidade desse blog. òtimos escritos, gostei muito. Um texto simples e repleto de beleza. Meus parabéns...
Bjus insanos e escarlates

Anônimo disse...

Rosa, li Pipoca, os outros contos, e só posso dizer que o seu texto me emociona profundamente. Ele tem uma qualidade muito próxima da poesia, um contato tênue com o enredo, maximizado pelo uso muito cuidadoso das palavras. Belo, belo, belo. Parabéns.

Anônimo disse...

CLAP! CLAP! CLAP! Coisa mais linda, Rosa. Adorei.
Um beijo.

Anônimo disse...

Tem formigas nos três últimos contos. E um só tamanduá. Tem Rosa e André, mas não tem Rona. Ele fica de fora, roendo, roendo.
Ps. Rosa: mandei meu micro pro conserto e delectaram toda minha lista. Manda um e-mail pr mim.
Rona.