
Quando lhe tirou a venda, eis o bosque. Caminharam sobre lama e folhas, pedras e galhos. Ela viu que o moço guardava um vidrinho. Pediu para ver e insistiu várias vezes. Ou que ele explicasse como um bosque nascia do nada, numa região sabidamente industrial e devastada. Está bem, ele disse, olha aqui: e do vidrinho leu o rótulo: bosque em cápsulas. Bastava encontrar qualquer poça de lama e ploft!, uma explosão densa e vegetal, e estava criado o pulmão verde em questão de segundos.
Para provar, resolveu mostrar-lhe por fora o limite, suas fronteiras perto de uma fábrica abandonada de laticínios. Apenas, caminhando um pouco mais, ele estranhou aquele barranco de terminações imprevistas e abruptas. Quando afastou uma ramagem violenta, escorregou à beira de um precipício, o gesto ofegante das mãos nas raízes da terra, ela segurando-o pelo braço, enquanto olhavam assustados para um ponto qualquer. Ali, preso num arbusto próximo, não era o resto de uma embalagem abandonada por incautos, ainda a derramar seu pó de abismos?
Foto de Noberto Moreira
André Ricardo Aguiar
4 comentários:
André, é sempre um prazer ler seus escritos. Aliás, parabéns igualmente a Rosa, este blog é um colírio. Quisera todos os abismos fossem assim, onde a queda é uma viagem feliz que termina num bosque, nos braços de belas palavras.
Um bosque selvagem, emaranhado de belas imagens, onde pia coruja e canta onça. E os abismos ... Muito bom!
Imagem louca essa do bosque! E um clima onírico, com este final aberto...gostei! Voltarei mais vezes...
Verde o que é bom é meu
... abismadamente meu
* Quando eu crescer quero escrever assim. Como quem respira... Da forma mais natural e cotidianamente possível.
Postar um comentário